Alergia a medicamentos

alergia 1O número de novos medicamentos para as mais variadas doenças aumenta continuamente. Se por um lado eles ajudam a aprimorar tratamentos, contribuem também para impulsionar a incidência de alergias a eles. Estudos mostram que de 3% a 6% das admissões hospitalares estão relacionadas a algum tipo de reação adversa a medicamento, que também pode atingir entre 10% e 15% dos pacientes internados. Mas apenas um terço dessas reações envolvem mecanismos imunológicos, sendo consideradas alérgicas.

A alergia é uma manifestação de hipersensibilidade do sistema imunológico a agentes externos que normalmente não são nocivos. E com os medicamentos não é diferente. “A reação do sistema imunológico a agressões de agentes como vírus, bactérias e fungos é fundamental para evitar uma série de doenças. Mas, no caso das alergias, essa resposta se dá contra agentes que deveriam ser ignorados”, diz o Dr. Luiz Vicente Rizzo, livre-docente em Imunologia e diretor-superintendente de Pesquisa do Instituto de Ensino e Pesquisa do Einstein.

A complexidade de causas e mecanismos de alergias de qualquer natureza faz deste um assunto no qual ainda há amplo terreno para estudos, pesquisas e indagações. Algumas alergias têm predisposição genética, podendo afetar qualquer pessoa, independentemente de idade, sexo ou etnia. Filhos com pai ou mãe portadores de algumas alergias, como asma brônquica ou rinite alérgica, têm 25% de probabilidade de também serem alérgicos (atópicos, na linguagem técnica). Se pai e mãe forem alérgicos, essa probabilidade sobe para 50%. Portadores de doenças que afetam o sistema imunológico ou metabólico também podem se tornar atópicos.

Mecanismo da alergia

A alergia ocorre porque o sistema imunológico “confunde” substâncias inofensivas com agentes invasores e cria anticorpos para destruí-los. Os anticorpos associados à alergia são chamados de imunoglobulinas da classe E (IgE) e são proteínas do sistema imunológico. Quando há novos contatos dos antígenos (agentes externos) com o sistema imunológico do alérgico, os anticorpos IgE os reconhecem e partem para o ataque, liberando os chamados mediadores, que causam os sintomas alérgicos. Entre os mediadores mais conhecidos está a histamina, embora certas substâncias liberadas em situações de estresse também atuem da mesma forma. Daí o fato de o estresse ser considerado fator agravante para determinadas reações alérgicas.

Por se tratar de uma resposta imune, a alergia nunca se manifesta no primeiro contato do sistema imunológico com o antígeno. Para que a reação alérgica ocorra, é preciso ter havido ao menos um contato prévio com a substância para que se formem os anticorpos IgE. “Relatos de resposta alérgica ao primeiro contato são sugestivos de reação cruzada, ou seja, de exposição anterior a outro tipo de agente de constituição semelhante”, explica o Dr. Rizzo.

A definição da alergia a medicamentos como problema de saúde data da segunda metade do século XX. Por serem amplamente prescritos e consumidos, antibióticos e anti-inflamatórios estão entre os que mais provocam reações alérgicas. A grande maioria dos sintomas de alergia medicamentosa independe da dose e engloba manifestações clínicas diversas, com mecanismos heterogêneos, podendo ocorrer em minutos ou até dias após a ingestão da medicação. “Os sintomas são extremamente variáveis, mas 80% deles manifestam-se na pele – coceira, urticária, rash (erupção cutânea), inchaço nos lábios e nas pálpebras”, diz a Dra. Cristina Maria Kokron, alergista e imunopatologista do Einstein.

Reações sistêmicas mais graves incluem a queda da pressão arterial e a dificuldade respiratória causada pelo edema da glote, a estrutura da laringe que se abre para permitir a passagem do ar para os pulmões e se fecha para impedir que eles recebam líquidos e alimentos destinados ao estômago. A resposta alérgica faz com que a glote inche e obstrua a passagem do ar. Ambos os sintomas caracterizam o choque anafilático, que pode levar à morte caso não haja socorro rápido e adequado. “Ainda são desconhecidos os mecanismos pelos quais um alérgico apresenta sintomas mais leves e outro pode chegar ao choque”, afirma a Dra. Cristina.

Diagnóstico e tratamento

Toda manifestação inesperada após a ingestão de qualquer medicamento deve ser objeto de observação médica. A pessoa deve buscar atendimento rápido em um hospital ou pronto-atendimento. A história clínica e as informações sobre consumo pregresso e recente de medicamentos são essenciais para a precisão do diagnóstico, assim como o exame clínico apurado. Testes alérgicos podem ser empregados para esclarecer o diagnóstico. “O futuro aponta para diagnósticos cada vez mais precisos graças ao desenvolvimento de novos tipos de testes e o aperfeiçoamento dos já existentes”, destaca o Dr. Rizzo.

Interromper a utilização do medicamento suspeito é a primeira providência no tratamento da reação alérgica, substituindo-o por outro que possua princípio ativo diferente. No tratamento, podem ser usados medicamentos anti-histamínicos e/ou corticosteroides. Quando há choque anafilático utiliza-se a adrenalina para garantir que o paciente retome níveis adequados de respiração e de pressão arterial. A dessensibilização – terapia que suprime as reações alérgicas a certas substâncias e é muito utilizada para antígenos, como pólen e poeira – não tem mostrado eficácia no caso de medicamentos.

alergia 2Comprovada a alergia a um ou mais medicamentos, o médico alergista será essencial para a definição da conduta terapêutica.

Alergia ou reação adversa?

É comum que manifestações inesperadas após a utilização de medicamentos sejam chamadas de alergias, o que nem sempre é correto. As reações adversas englobam todas as reações a medicamentos, podendo ser previsíveis ou imprevisíveis. As reações alérgicas ou de hipersensibilidade são as que envolvem um mecanismo imunológico. “90% das manifestações na primeira utilização do medicamento são reações adversas e não alérgicas”, explica a Dra. Cristina.

Diferenciar uma da outra é possível conhecendo-se o medicamento suspeito, o mecanismo de ação e os efeitos colaterais, realizando-se exame clínico e exames laboratoriais, além de testes alérgicos quando indicado. “Se for alergia, significa que a pessoa teve contato prévio com um ou mais antígenos que possuem a mesma constituição”, diz a médica. Exemplo típico está nas reações provocadas por antibióticos, como as penicilinas e seus derivados. Se o paciente já tiver desenvolvido anticorpos IgE por contato anterior, poderá apresentar resposta alérgica ao utilizar pela primeira vez um antibiótico com a mesma característica.

Diferentemente da reação adversa, que pode se manifestar numa ocasião e não em outra, dependendo da sensibilidade pessoal de quem utiliza o medicamento, a alergia é definitiva e, no caso de medicamentos, incurável. Em certos casos, quando não há alternativa de tratamento, pode-se fazer um tratamento de dessensibilização, que modifica a resposta imunológica ao medicamento, permitindo que ele seja administrado ao paciente temporariamente, de forma segura. Na grande maioria dos casos, o medicamento suspeito deve obrigatoriamente ser suspenso e substituído por outro de princípio ativo diferente. Com isso, evitam-se novas ocorrências e também a interrupção do tratamento da doença para o qual o medicamento anterior foi prescrito. Outra providência essencial para prevenir riscos e problemas futuros é informar à escola, local de trabalho, médicos, clínicas e hospitais qualquer condição relacionada à alergia medicamentosa.

Fonte: Hospital Albert Einstein

Colaboração: Farmacêuticas Daniele C. O. Zampar e Joice Cruciol

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